
Definitivamente Budapeste é um livro e não um filme.
O que fica após duas cumpridas horas no cinema são algumas boas frases e a idéia de que entender profundamente um idioma estrangeiro é realmente ganhar uma nova cidadania.
A palavra é o povo.
Encontro com escritores que pretendem carregar a poesia pela vida como imagem de virgem no andor em procissão.
Outros a carregam como o frango do Nelson Cavaquinho.
Em uma história mais saborosa que qualquer penosa, a mulher de Nelson contava o episódio em que incumbido de comprar o almoço de sábado, saiu às dez da manhã e retornou na segunda por volta do mesmo horário.
Voltou um trapo,vindo de animadíssimos pés sujos e quem sabe de que quartos suspeitos.
Amarrotado, cheirando azedo, já na abissal ressaca avançou portãozinho adentro com cara de cachorro ladrão, segurando a ave meio apodrecida como um troféu, como um álibi. Foi seguido por um verdadeiro amigo, um fiel escudeiro de orgia que implorou à esposa do poeta: - Não briga com o Nelson, não. Você não sabe o que ele fez para chegar com esse frango em casa, até correr atrás de bonde onde o havia esquecido, ele correu!
Estou mais para Nelson que para sacristão.
A poesia não nasce para revestir seu autor de respeitabilidade e status social.
A poesia é o alimento debaixo do braço, do suvaco suado, enquanto a vida nos vive em suas corredeiras.
A vida é uma ladeira.
A velhice cada vez me assusta mais. Não a minha que chega aos poucos, como quem não quer nada, disfarçando.
Chega como aquele hóspede, mansinho, humilde, se desculpando pelo incômodo, mas que se aboleta na casa e quer dominá-la, apossar-se dela toda, mais cedo ou mais tarde.
Ela me assusta e horroriza por vê-la devastando aos que amo.
Arranca as rodas.
Para alguns poucos, alguns raros, restam as asas.
A pizza de boteco é uma instituição e certos bares tinham que ser tombados como patrimônio da humanidade que habita aquele bairro.
Um bom boteco tem sempre um bicheiro de plantão, um garçom tão antigo como a casa e clientes que podem ter o DNA de seu cotovelo encontrado no balcão.
Saber que a cerveja é inesgotável enche um homem de confiança no planeta.
O provincianismo é como o tempero imutável de certos pratos no almoço de domingo com a família.
Gilberto Mendes e Eliane agora tem uma cadela que come em sua mesa e dorme no seu quarto. Chama-se Mel e tomou conta da casa como fazem os espertos cachorrinhos.
Um filho ou uma filha peluda alegra a vida, faz a ponte entre nossas estressadas existências com o mundo sem pecado e sem perdão da natureza.
No final somos nós que abanamos o rabo para aquele nariz molhado, aquele amor tão sincero.
Durante o progrma de rádio "Quatro Ases e Um Coringa", no intervalo com os microfones desligados, entrevistados e entrevistadores, discorrem sobre os pepézinhos e os pepézões das grandes cantoras.
Os pés da Badi Assad são lembrados, como seres autônomos, despidos, que dançam como tuaregues, com a mesma lascívia selvagem em volta da fogueira no deserto, sob a lua.
Os de Diana Krall, sabem todos os truques da sedução civilizada. Nova-iorquinos, entronizados em saltos sete e meio, fabricam sonhos nos pedais de seu Steinway.
Dançam em salões utópicos e repousam banhando-se em cascatas de champanhe.
Foi reconhecido em uma discussão cultural de altos e baixos que o advento da segmentação literária de conformidade com a orientação sexual dos autores é uma curiosa realidade.
Por alguns foi considerado inaceitável que as Escritoras Lésbicas ganhem um espaço especial em uma feira literária e os Escritores Punheteiros não recebam os mesmos privilégios.
Abaixo a discriminação para o Quarto Sexo.
Os vendedores de Santos: um super plugado e eficiente em uma loja de tênis, uma anta letárgica em uma loja de instrumentos musicais, uma toupeira néscia tentando digitar um autor que desconhece no computador da livraria.
Fatos isolados ou o retrato de uma época?